Carreiras | Empregos

Por João Prado
Jornalista, escritor, publicitário, professor, pesquisador de tecnologia da Universidade Harvard, assessor político e diretor de uma multinacional. Caso Marcelo Coutinho precisasse apresentar seu breve histórico profissional para alguém, certamente ele citaria todas as profissões mencionadas acima.
O diretor de análise do IBOPE, maior grupo de pesquisa de opinião do país, é um homem de facetas diferentes, apesar de o próprio dizer que suas diversas profissões não são tão distintas como parecem. “Acaso”. Essa é a palavra que Coutinho usa para justificar a sua presença em situações no mínimo centrais para a história do Brasil – pelo menos dos anos 80 para cá. Quer exemplos? Por exemplo, foi editor da agência estado em um dos primeiros projetos com internet no país, foi assessor de comunicação da campanha que elegeu a então “desconhecida” Luiza Erundina como prefeita de São Paulo e também da campanha, em 1989, do atual presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Mas não para por ai. Coutinho também foi um dos poucos repórteres que conseguiu entrevistar Dalai Lama e Noam Chomsky, estudioso que revolucionou os estudos da lingüística teórica.
Doutor em Sociologia pela USP, bacharel em publicidade e administração, Marcelo Coutinho também é professor em jornalismo na Cásper Líbero e de administração da Fundação Getúlio Vargas. Poderia dizer para o leitor que acabou a apresentação, mas o fato é que o diretor do IBOPE ainda arruma tempo para viajar e escalar montanhas na Índia, no Nepal, Patagônia e Paquistão. O resto você lê na entrevista abaixo.
Boa leitura!
Empregos.com.br – Quando você começou a sua vida profissional?
Marcelo Coutinho – Hoje. Todos os dias que levanto penso nisso. Fiz tantas coisas que sempre acho que hoje é o meu tempo, o meu dia. Poderia citar qualquer outra coisa, mas o fato é que realmente penso dessa forma. Não tenho uma carreira no sentido linear, que é a maneira como as pessoas pensam uma vida profissional. Na verdade eu não tenho uma carreira!
Empregos.com.br – Como assim?
Marcelo Coutinho – A palavra carreira vem do latim ‘carraria’, que significa caminho, trilha, continuidade. Eu não fiz uma carreira como a maioria dos diretores que estão há anos dentro das companhias onde trabalham. Minha trajetória não foi linear nesse sentido, até porque não é como encarei a minha vida profissional. Muitas coisas que fiz aconteceram por acaso.
Empregos.com.br – Conte como foram essas situações.
Marcelo Coutinho – Em cada emprego que estava apareceu uma oportunidade. Foi assim no IBOPE. Eu estava nos EUA como sócio de uma empresa de internet, naquela época da bolha em 2000. Consegui levantar 11 milhões e quase falir em apenas 18 meses. Foi uma loucura! Cheguei a trabalhar 72 horas dentro do escritório, onde dormia, comia e até me divertia nas horas vagas. Antes disso, tinha ido aos EUA porque consegui uma vaga em Harvard. Essa vaga é o sonho de muitas pessoas! Mas larguei para ser sócio dessa companhia, que depois foi fechada. Exatamente nesse período fui convidado para trabalhar no IBOPE, por um conhecido da época em que trabalhei como editor na Agência Estado, em um dos primeiros projetos de internet que aconteceu no país. Tudo foi fruto do acaso.
Empregos.com.br – Isso soa como falsa modéstia, não?
Marcelo Coutinho – De forma alguma. Acredito muito no acaso, que pode ser definido como uma série de fatores para que aconteça. Mas é uma palavra presente na minha vida profissional. Por exemplo, fui chamado para dar aulas por um ex-professor que tive na Fundação Getúlio Vargas. O acaso pode ser o que existe entre as peças desse jogo de quebra cabeças. Não saberia definir bem o que é, mas sei que ele existe.
Empregos.com.br – Além de ser diretor no IBOPE, você também exerce a profissão de professor universitário. Como é sua relação com os alunos?
Marcelo Coutinho – No caso da Cásper Líbero eu convivo com alunos de jornalismo. São verdadeiros tubarões (risos). Não comparo dar aulas com o meu trabalho dentro do IBOPE, mas posso dizer que o nível de exigência cobrado pelos alunos é muito grande. Tenho que estar constantemente atualizado e conhecedor dos mais diversos assuntos, que vão além das minhas aulas. Nesse caso me sinto compensado profissionalmente por não ter abandonado o lado acadêmico.
Empregos.com.br – Parece que as companhias hoje em dia são mais vulneráveis a crises do que no passado. As carreiras se moldaram a essa lógica?
Marcelo Coutinho – Essa é uma pergunta difícil de responder. Acho que a lógica do caos é mais presente atualmente. Mas o ideal é que existam os dois lados: Um mais conservador e outro que arrisca mais. Optei por uma vida profissional não linear e deu certo, mas para alguns acredito que seguir por anos dentro de uma companhia também é uma opção correta. Acredito que existam espaços para as duas formas profissionais. Uma não exclui a possibilidade de existir a outra e nem faz uma opção ser a mais correta. Mas o que noto é um conflito interessante de gerações.
Empregos.com.br – Que espécie de conflito?
Marcelo Coutinho – O profissional que se formou há três décadas tem que aprender muitas coisas com o jovem que trabalha em uma empresa hoje em dia. E vice e versa. É um conflito sadio na minha percepção, de duas visões moldadas por experiências de mundo distintas. O jovem hoje é mais preparado para uma carreira não linear, justamente porque o mundo corporativo atual está dessa forma. Por isso as exigências por um perfil adequado sejam mais rigorosas. Do meu lado, fiz escolhas de uma carreira não linear que podem não ser a melhor opção para alguns jovens.
Empregos.com.br – Quais escolhas?
Marcelo Coutinho – Por exemplo, não tenho filhos. Vou à casa de amigos e vejo que muitos deles quiseram ter uma família e dispensaram a ‘liberdade’ pela qual optei. Um aluno meu disse certa vez: ‘Professor, minha mulher está grávida, trabalho às vezes 16 horas por dia e quero fazer o meu mestrado. Você me ajuda?’. Respondi para ele: ‘Você quer fazer muitas coisas, ser um bom pai, fazer um bom mestrado e ainda cumprir a carga horária imposta. Acho que você tem que pensar em excluir alguma coisa (risos)’. Não que eu ache que é impossível. Mas penso que ser um bom pai exige tempo e dedicação para isso. Acho que as pessoas têm que saber excluir certas coisas para fazer bem outras. A vida é feita disso… Escolhas.
Empregos.com.br – Qual o conselho que você daria para um jovem que está no início de sua vida profissional?
Marcelo Coutinho – O importante é saber medir riscos. Eles vão sempre existir por toda a vida. Aliás, a vida é uma narrativa, que quando contada toma outra proporção. Nessa entrevista vai parecer que minhas escolhas e minha ‘carreira’ foi fácil, mas na verdade não foi. Cada escolha foi um momento de angústia e horas não dormidas. Largo Harvard e viro sócio de uma empresa de internet? Priorizo a minha carreira e decido por não ter filhos? Acho que a principal característica que tive ao longo desses anos foi justamente saber medir os riscos e assumir todos eles. Posso dizer que dessa maneira acordo satisfeito a maioria dos dias e digo sempre: ‘Meu tempo é hoje’.

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