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Agora, uma notícia confortadora: é possível aprender inglês sem sofrer, respeitando cultura, potencialidades e, especialmente, a necessidade de cada um. Para espanto dos puristas, admite-se até cometer erros formais, desde que você se comunique. Quem prega o advento do “inglês possível” é a professora e consultora Cristina Schumacher, também fluente em alemão, francês, espanhol e japonês. Autora dos livros “Inglês Urgente para Brasileiros: Soluções Simples e Práticas” e “Alemão Urgente para Brasileiros: Soluções simples e rápidas para aprender de vez”, Cristina sugere que se desmistifique o inglês e alerta: duvide da escola que fizer promessas milagrosas.
Amanhã – Por que é urgente para o brasileiro estudar inglês?
Cristina – Porque a globalização acontece no inglês, e quem não tem condições de usar essa ferramenta de comunicação é excluído do processo, fica marginal, assistindo.
Amanhã – Por que o inglês se tornou o idioma da globalização?
Cristina – O que acontece com o inglês é semelhante ao que aconteceu com o latim na época do Império Romano ou com o francês no século passado. A língua mais falada pela maior parte das pessoas num determinado momento do mundo reflete a cultura e a hegemonia de cada época. Hoje, os Estados Unidos fazem as regras do jogo, do ponto de vista econômico, cultural. Era somente no Ocidente, agora é quase em todo o mundo.
Amanhã- A difusão do inglês pelo mundo se explica apenas pela hegemonia americana?
Cristina – Eu não faria essa dedução tão simples. Existem outros fatores. A Inglaterra teve um papel parecido com o dos Estados Unidos. Foram dois golpes sucessivos de culturas que usam essa língua. A língua vem na esteira de outros movimentos de cunho econômico, social, cultural. E, ao contrário do que se possa pensar, o inglês é muito flexível. Pessoas de diferentes culturas usam inglês para se comunicar. Essa é a grande flexibilização: o uso de uma forma que não tem as exigências do falante nativo, do inglês, do americano. O inglês é a língua da globalização porque é a língua falada por estas culturas, estes dois povos, o inglês e depois o americano, que ocuparam uma posição de proeminência econômica. É o capitalismo, que tem o seu maior exemplo na famosa terra de oportunidades que são os Estados Unidos.
Amanhã- O inglês carrega esta visão da terra de oportunidades? Simboliza os Estados Unidos?
Cristina – Não perdemos em desvincular uma coisa da outra. A partir do momento em que a língua inglesa ganha status de ferramenta de comunicação internacional, ela não precisa ficar vinculada à sua cultura de origem porque não é falada com aquela complexidade e não se reveste da mesma formalidade. Se eu falar com um russo, vou conversar em inglês com ele. Se um alemão se encontrar com um japonês, vai falar em inglês. E esse inglês será muito simples do ponto de vista estrutural. A questão é esta: tenho a minha a cultura, não preciso passar por cima dela para estar capacitada a usar outra língua. Há uma expectativa, principalmente entre professores, de buscar a pronúncia correta, a estrutura perfeita. Isso é louvável. Por outro lado, culturalmente, jamais vou conseguir apagar o meu passado, o meu entorno, a minha leitura da realidade – a realidade brasileira. Isso aparece quando eu falo, independentemente da língua que use. Ou nos dedicamos de corpo e alma a nos embebedar de uma outra cultura… Mas parece que não é esse o desejo das pessoas que estão aí trabalhando, tentando ganhar espaço. Elas querem saber inglês para se comunicar, não para se vestir com a bandeira dos Estados Unidos. Há diferença entre estudar a língua com a intenção de se envolver naquela cultura ou com um fim utilitário.
Amanhã- E você prefere essa visão pragmática, por assim dizer?
Cristina – Prefiro, por ser mais realista. Com essa perspectiva, posso aceitar imperfeições que se impõem pela condição das pessoas: pouco tempo, pouca inclinação. Todo o mundo acha que tem de aprender com a excelência do professor ou do falante nativo, mas isso não é necessário.
Amanhã- Qual é a origem da vinculação cultural que se faz entre o inglês e o american way?
Cristina – É um processo natural, é a língua de origem dessas culturas. Mas eu posso intervir. Não tenho compromisso cultural com ninguém a não ser comigo mesma. É normal que leve a minha bagagem aonde quer que vá e, em função da minha condição de aprendizagem, flexibilize a exigência de espelhar o falante nativo no processo. Falar errado é melhor do que ficar quieto.
Amanhã- O que diferencia o inglês utilitário do inglês formal?
Cristina – Essa separação se realiza naturalmente. Tenho níveis de correção que posso obter, independentemente do processo que sigo. Há pessoas que se dedicam ao processo tradicional, têm nível de correção mediano e não conseguem ir além em função da aptidão e do tempo de dedicação. Quando se usa o falante nativo como referência, espera-se que se espelhe sempre nele. O que defendo é tornar aceitáveis os erros; eles já acontecem. O importante é compreender e ser compreendido.
Amanhã- Dê exemplos de aplicações do idioma em que esse nível de tolerância possa ser mais largo.
Cristina – O gerente de manutenção precisa entrar em contato com o fornecedor que, casualmente, é alemão. Os dois têm que falar sobre o equipamento. Vai fazer diferença usar ou não o verbo auxiliar do passado para fazer a minha pergunta? Mesmo sem o verbo auxiliar, a outra pessoa vai entender. Por outro lado, se fizer uma palestra para uma comunidade científica, é desejável que o meu padrão vocabular e de pronúncia esteja num nível em que não gere estranheza. A escolha de linguagem espelha uma situação cultural. O xis da questão é encontrar o ponto de flexibilização, entender que, em certos casos, alguns erros nem devem ser corrigidos, sob pena de gerar desistências.
Amanhã- O que perde um empresário que busca negócios nos Estados Unidos e não domina o idioma ou fala num nível primário?
Cristina – Depende da colaboração do interlocutor. A língua é importante porque possibilita a comunicação, mas interação conta tanto quanto isso. Já observei pessoas que falam pouco ou mal e conseguem se comunicar bem. O que ele perde? Se for um excelente negociador, talvez nada perca. Se for mau negociador, talvez não adiante falar um excelente inglês.
Amanhã- Um profissional de 40 anos nunca pensou que precisasse usar o inglês. Sua empresa é vendida a uma organização norte-americana e, de repente, ele se vê obrigado a aprender. Como fazê-lo sem traumas?
Cristina – Com um casamento entre necessidades comunicativas, capacidades e objetivos de aprendizagem. Uma pessoa de 40 anos vai buscar ajuda de um profissional que entenda as suas peculiaridades, sua individualidade, e traga isso para o processo. Com relação a aprender rápido, duvide de promessas. Ninguém pode dizer que você vai aprender inglês em um ano. É impossível precisar quanto tempo cada pessoa leva em seu aprendizado. Em um ano, você pode chegar a determinados conhecimentos, de estrutura, mas o que vai usar daquilo depende de você. É importante a pessoa reconhecer suas limitações e seus pendores e aliar o menos possível esse processo ao sofrimento. Só se aprende numa situação em que estamos relaxados. O aprendizado deve estar associado a coisas que gerem interesse genuíno no aluno. Há uma angústia: o inglês se transformou em sinônimo de oportunidade profissional.
Amanhã- Qual a linha teórica adequada para aprender de fato?
Cristina – É aquela linha que se aproxima mais da experiência com o aprendizado que temos com a língua materna. Aquela que faz com que eu fale muito, escute muito, use muito a língua, para que me familiarize. Simula a aprendizagem que a gente tem com a língua materna em regime extensivo, faz a pessoa entrar em contato de forma simulada, usando muitos exemplos em regime de repetição. É o chamado “método direto”. Mas algumas pessoas podem não se adaptar. O que eu defendo é o seguinte: usar o máximo possível da capacidade de raciocínio. Não é exatamente isso que vai fazer com que você fale, mas, com certeza, a capacidade de raciocínio desmistifica a aprendizagem, tira do escuro aquela grande área capaz de gerar temores e medos.
Amanhã- Por que o estudo do inglês foi mistificado?
Cristina – Porque a exigência de aprender aumentou, e os processos ficaram muito parecidos. Tenho hoje as mesmas estruturas de cursos, as mesmas ações, uma grande fórmula que é usar a cultura de origem como espelho, como ambiente nos livros-textos. Mas a necessidade de aprender se espalhou enormemente. Em geral, pessoas adultas descobrem que precisam disso, e já não têm tempo, o que faz com que a urgência aumente e esse mito se nutra, com pouca disponibilidade até psicológica de se colocar numa posição de aprendiz. Isso alimenta a máquina de desistir, que alimenta o mito da dificuldade. É curiosa a relação das pessoas com a língua. Dizem até que não sabem português. Acho uma graça: elas falam a língua e dizem que não sabem. Tem algo errado. Todas as pessoas que falam português sabem português. O grande trabalho é o de juntar esses dois pólos esquizofrenicamente separados. Eu sei a minha língua materna, posso até não falar como a gramática manda, mas me comunico claramente. E potencialmente posso saber qualquer outra.
Amanhã- Todo o mundo pode aprender inglês?
Cristina – Todas as pessoas podem aprender se tiverem claro que vão estar trocando o ponto de vista da realidade. Uma língua é um ponto de vista da realidade, uma forma de ver as coisas. É outra forma de organizar a comunicação, flexibilizar a visão de mundo. Então, todas as pessoas podem aprender inglês como todas as pessoas podem aquilo que quiserem, desde que estejam motivadas.

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