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por Rogério Martins
Você conhece aquela história do homem que foi convidado para assistir a uma sinfonia? Pois é, nesta era de desenfreada ânsia por reengenharia, benchmark, qualidade total, downsizing, terceirizações, eficiência, produtividade e outras teorias mais, creio ser interessante refletir sobre uma parábola que nos alerta sobre os riscos de uma visão monomaníaca, característica dos profundos especialistas.
O Presidente de uma grande empresa recebeu algumas entradas para um concerto em que seria apresentada a sinfonia Inacabada de Schubert. Como ele já tinha compromisso para aquela noite, deu as entradas para um de seus assessores, um especialista em produtividade. Na manhã após o concerto, o presidente encontrou o seguinte memorando sobre a sua mesa.
Dizia: “Prezado Senhor, muito obrigado pelas entradas. No geral, tivemos uma noite muito agradável. Mas sobre a sinfonia existem algumas coisas que poderiam ser melhoradas. Por um longo período de tempo os quatro tocadores de oboé não tinham nada o que fazer. O número deles deve ser imediatamente reduzido e o seu trabalho distribuído entre o resto da orquestra, eliminando, deste modo, picos de atividade e excesso de pessoal.
Todos os doze violinos tocavam notas idênticas. Isto me parece uma duplicação desnecessária e deve haver um corte drástico no número de elementos neste setor. Se um volume alto de som é realmente necessário, isto poderia ser obtido através de um amplificador elétrico.
Muito esforço e atenção eram necessários na execução das semicolcheias. Isto me parece um refinamento excessivo, se analisado do ponto de vista custo/benefício. Recomendo que todas as notas sejam arredondadas para a mais próxima colcheia.
Se isto for feito, sugiro que o departamento de Seleção contrate estagiários ou operadores de nível mais baixo, que certamente terão salários inferiores aos atuais músicos.
Não vejo nenhum propósito útil em repetir com instrumentos de sopro as passagens que já tenham sido tocadas pelas cordas. Trata-se claramente de uma duplicidade de funções. Se todas estas passagens redundantes forem eliminadas o concerto poderia ser encurtado em, pelo menos, vinte minutos. Na condição de especialista que sou, lembraria que o momento atual das empresas requer uma concentração de esforços em atividades de racionalização, eficiência, competitividade, principalmente se considerada a globalização da economia. Voltando ainda ao concerto, se Schubert tivesse prestado atenção a estas questões por mim levantadas, indiscutivelmente teria sido capaz de terminar esta sinfonia”.
Há algum tempo, quando este ótimo texto de Humbert Malhaman chegou às minhas mãos, pensei sobre como interpretamos o que está a nossa volta. Quais as atitudes que temos tomado diante do processo contínuo de mudanças?
O fato é que no dia-a-dia das organizações e mesmo de nossos lares é comum vermos diversas pessoas que agem como o personagem da parábola. Parecem estar vivendo sob uma redoma intransponível que turva a mente e faz com que só enxerguem aquilo que é mais confortável e conhecido. A sensação é de que não estão vivendo este momento de transformação, de mudanças.
Este processo é irreversível e exige novas posturas, criatividade para lidar com imprevistos, outras formas de se relacionar, de se postar diante das novas situações que a cada momento se transformam, apresentando-nos novos desafios e ameaças.
Resta saber como iremos interpretar. Para os chineses, o ideograma que simboliza a ameaça é o mesmo para as oportunidades, portanto, para os otimistas este momento é rico para que negócios aconteçam, idéias floresçam, parcerias sejam criadas e inovações, implementadas. Mas para aqueles que temem a mudança, este momento é uma grande ameaça à sua “estabilidade”, gerando medo, frustração, paralisia ou atitudes como a do especialista em produtividade, descrita no texto.
Desde que o homem mudou seus hábitos para poder sobreviver, saindo das cavernas até chegar aos atuais arranha-céus, inventando o fogo, a roda, a máquina a vapor, o computador – e tantos outros inventos importantes – ele encontrou uma forma de dominar o mundo que o cerca. Não somente sua capacitação intelectual o tornou “dono da situação”, mas também sua capacidade de adaptar-se às adversidades, muitas vezes por ele mesmo criadas.
O que vivemos hoje é fruto desta constante motivação que o homem sempre teve para as mudanças. Estar preparado para elas é ver o mundo sem filtros. Observar, livre de preconceitos, tudo que nos cerca. Conhecer e respeitar as tradições, culturas e anseios dos outros. É educar e estar aberto para aprender.
Que tal então se adotássemos estas “novas” práticas: melhoria contínua do homem; reengenharia dos valores pessoais; benchmark de pessoas; downsizing de preconceitos e velhas teorias; marketing das qualidades humanas; qualidade total do ser humano; produtividade de emoções verdadeiras…

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