Carreiras | Empregos

por Ana Maria Cadavez*
Quando uma empresa contrata profissionais, vários objetivos sustentam este processo. Pode ser que haja problemas a serem
resolvidos, planos/projetos a serem elaborados e implementados, crescimento, reestruturação, centralização, descentralização, compra/venda, entre outros. Talvez o atual ocupante do cargo não tenha trazido os resultados esperados e, então, procura-se outro mais apto. O profissional aceitou outra oferta de trabalho ou mesmo foi remanejado internamente. Ou a empresa pode estar formando o futuro grupo de executivos, atraindo estagiários e trainees.
Não importam os motivos, o foco da empresa é contratar o profissional adequado para determinadas atividades presentes e futuras. E aí começa o processo seletivo. Muitos candidatos são contatados, entrevistados, analisados e testados. A cada etapa do processo, novas e importantes informações sobre cada candidato em potencial são identificadas e, conseqüentemente, poucos prosseguem em direção à contratação.
Após algumas semanas, finalmente, a empresa já está com os finalistas que, teoricamente, estão em igualdade de condições para receber a oferta final por parte da empresa. Aqui cabe uma pergunta: “O que mais agregaria valor e ajudaria a validar este processo de contratação?” Sem dúvida, obter a percepção de quem conhece os profissionais/finalistas em ação. Quem são estas pessoas? Sem dúvida, ex-chefes, ex-pares e ex-subordinados.
O que os profissionais que conviveram com os candidatos finalistas podem acrescentar? A percepção deste grupo de pessoas pode validar questões pertinentes para a empresa, principalmente quanto às competências fundamentais/universais. Quais são? Por exemplo, uma muito importante: atitudes de liderança. Já que a empresa está contratando um simples mortal e não um líder político, religioso, esportivo ou empresarial, é preciso assegurar que o candidato tenha as competências que possam credenciá-lo a ser um líder organizacional.
O que compõem essas atitudes de liderança e que todas as empresas procuram em quem vão contratar? São várias e nem sempre muito fáceis de encontrar em uma mesma pessoa/profissional.
· Ética e honestidade estão no topo desta pirâmide. “Puxadas de tapete”, fofocas, “diz-que-disse”, fraudes, entre outras, tornam o ambiente interno predatório e os funcionários acabam gastando a maior parte do tempo, que deveria ser produtivo, em atacar/defender/ouvir/espalhar. Nem o melhor software pode superar a ineficácia gerada por um ambiente de trabalho em desequilíbro ético.
Relacionamento interpessoal: sub-grupos sempre aparecem quando pessoas atuam juntas e são naturais, pois têm por característica, afinidades em comum. Os iguais se aproximam e gostam de conviver entre si. Quem tem atitudes de liderança, não discrimina e se relaciona com todos, respeitando as diferenças e preferenciais individuais. Não transforma esta situação natural e espontânea em um final de campeonato estadual de futebol, em “quem não for do meu time é meu inimigo.”
Comunicação: ter a habilidade não só de falar (que é o maior treinamento e incentivo que todos nós recebemos desde o nascimento) mas, principalmente, de ouvir (nosso treinamento familiar/escolar/profissional não desenvolve esta habilidade, muito pelo contrário). Já se sabe porque temos dois ouvidos e uma só boca: é auto-explicativo. Explanar um assunto, difundir objetivos/planos/procedimentos/regras implica também em ouvir o outro. Ouvir mesmo. Permitir que o outro termine o seu raciocínio e levá-lo em consideração, mesmo que pense diferente, mesmo que queira uma colocação diferente. O que mais observamos é: interromper o que o outro está falando e já finalizar o pensamento alheio propondo as soluções ou tentando já desqualificar o pensamento do outro. Na comunicação (falar/ouvir) cabe também uma outra questão para manter o ambiente de trabalho saudável e cortar em pelo menos 90% da vida útil das fofocas e diz-que-diz: ouvir os dois lados de uma questão. Por não estarmos habituados a ouvir, normalmente quando alguém leva à chefia algo desabonador sobre outro colega, a chefia já vai “tomar satisfação” de quem foi vítima de uma armadilha e falta de ética. Quem tem atitudes de liderança, agradece a quem trouxe “a novidade”, chama a “vítima”, ouve com atenção esta última, pondera e tenta entender o que realmente aconteceu. Tira suas próprias conclusões, faz consultas às partes envolvidas caso algo fique confuso e, só depois, age. Os criadores de caso é que gostam de ver “o circo pegar fogo”, podem quando muito tentar aprontar mais uma. Se o chefe mantiver a postura de “ouvir as partes envolvidas em uma questão”, haverá uma redução sensível de fofocas e o ambiente se tornará mais produtiva, por ser mais saudável.
Visão estratégica: estará o profissional a ser contratado no nível estratégico ou no operacional? É ou está executivo? Sabe para onde a empresa deve ir ou finge que sabe? Tem visão de curto ou de longo prazo? Tem as competências para conduzir os negócios no rumo pré-traçado? Está preparado para redirecionar o negócio em bases sólidas ou é do tipo que só atua no superficial, com um discurso bonito de ouvir-se? O profissional sabe só fazer ou também tem a capacidade de pensar e ver à frente do presente?
Tomada de decisão: é do tipo que tem um processo de decisão interiorizado ou é do tipo “que empurra com a barriga” esperando que o tempo ou alguém decida por ele? É do tipo que assume o que decidiu ou titubeia face à responsabilidade da decisão? Corre risco ou não? Se corre risco é do tipo que não mede conseqüências ou tem embasamento técnico/teórico/prático para estar no controle de uma situação?
Flexibilidade e aderência às mudanças: só segue modismos para dizer que é adepto de mudanças, para sentir-se “in” ou é consistente e profundo em suas análises, propondo mudanças de maneira espontânea, madura e alinhada às verdadeiras necessidades do negócio? Às vezes é difícil distinguir o que é discurso e o que é prática.
Atualização: procura manter-se atualizado em seu campo de atuação bem como expandir sua base de conhecimento, freqüentando cursos/seminários/workshops, lendo revistas, livros, pesquisando na internet assunto interessantes? Lê as manchetes dos jornais, revistas, chamadas na internet e acha que está “por dentro” de tudo? As atitudes de liderança também englobam o aprender e o ensinar.
Poderíamos enumerar outras competências, habilidades e interesses que identificam o profissional com o perfil ideal. Estas, porém, já são suficientes para justificar a contratação, caso os candidatos as tenham bem desenvolvidas e estruturadas.
Durante as entrevistas se obtém as pistas necessárias que permitem antever que o profissional a ser contratado é o ideal. Porém, estas serão validadas pelas referências que podem atestar, sob o ponto de vista de quem conviveu com o candidato “em campo”, se ele as usa no dia-a-dia.
E se as referências não confirmarem estas atitudes de liderança? É preciso também validar quem dá as informações. Muitas vezes, ex-chefes/pares/subordinados que conviveram com o contratado em potencial podem não perceber a importância de seus testemunhos e, na falta de aptidão, dizem o tradicional “não há nada que o desabone”. Podem também estar sentindo “um pouquinho de inveja e ciúme”, por que não? Tornam-se lacônicos e, às vezes, evasivos.
Por isso, é muito importante o preparo de quem vai tirar as referências: deve se preparar com antecedência, pois estas informações serão o complemento de um processo longo, caro e que desperta expectativas nas pessoas envolvidas: contratante e contratado. Levantar referências não é atender um check list em que itens devem ser ticados. Perguntas devem ser bem formuladas e alinhadas ao que se deseja confirmar ou conhecer. Como normalmente esta checagem é feita por telefone, caso não haja uma preparação prévia, pode-se perder conteúdo/significado e prejudicar o candidato ou a própria empresa, caso algo não seja bem percebido ou gere uma interpretação inadequada.
Boas referências encerram um processo de recrutamento & seleção de qualquer profissional. Estas também podem abranger as de antecedentes: sem problemas com cheques, pagamentos, ações criminais/cíveis, etc. É evidente que se aparecer algo, o profissional a ser contratado deve ser chamado para saber o que está acontecendo e apresentar a sua versão. Afinal, ouvir é parte integrante de atitudes de liderança.
*Ana Maria Cadavez é gerente sênior da KPMG

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