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por Camila Micheletti
Dia 29 de agosto foi o Dia Nacional de Combate ao Fumo. Apesar disso, o cigarro ainda faz parte da rotina de 45% da população masculina e 20% da feminina no mundo. No Brasil os dados são ainda mais alarmantes: 50% dos homens e 45% das mulheres fazem uso do cigarro. Esses dados, que constam no livro “O Tabagismo visto sob vários aspectos”, de Jandira Torreiro de Carvalho – Ed. Medsi, mostram que, apesar das campanhas e da confirmação dos males causados pelo fumo, muitas pessoas ainda cultivam o hábito de dar várias tragadas por dia, e com muito prazer.
Pelo menos no âmbito corporativo, a crescente preocupação com a qualidade de vida tem levado muitas empresas a proibir o cigarro dentro dos escritórios. De acordo com Marianita Xavier, consultora da Novo Ser Consultores Associados, “este é um movimento pela saúde, que está cada vez mais acirrado e ganhando adesão em empresas de todos os portes e segmentos. Com essa decisão, a empresa até ajuda o funcionário a preservar um pouco sua saúde, já que ele passa a fumar menos”.
Já deu para perceber que a questão tem tudo a ver com o seu desenvolvimento profissional e com o futuro da sua carreira, não é? Fumantes ou não, os profissionais devem ficar atentos à opinião das corporações sobre essa questão.
Além do fator qualidade de vida, outra questão primordial na restrição ao fumo nas corporações diz respeito à própria segurança. Marianita conta que, em 2000, houve um grave incêndio em uma indústria química, que trouxe muitos danos à empresa. Durante as investigações, foi averiguado que o incêndio foi causado por uma bituca de cigarro, fato que levou a empresa a proibir o consumo de cigarros em suas dependências. Da mesma forma, a restrição também é bastante severa em indústrias de papel e celulose e editoras, já que uma simples faísca pode causar danos irreparáveis.
Para a consultora, a desaprovação do ato de fumar tem se mostrado mais latente nos últimos anos. “É literalmente uma mudança de comportamento. Antes, as pessoas tinham receio de falar, mas de uns tempos para cá a gente vem notando que a população tem se mostrado muito mais assertiva e reclama quando vê alguém fumando em local que não é permitido, seja na empresa, no restaurante ou no elevador”, explica Marianita.
A Novo Ser implanta programas de tratamento de dependência química nas empresas. Valéria Brasil, consultora de RH e coordenadora dos programas, explica que o objetivo é fazer uma abordagem didática, para sensibilizar e informar funcionários quanto às consequências do uso de drogas, mais especificamente do fumo. “O cigarro é uma droga estimulante do sistema nervoso central e a relação de dependência que existe com o cigarro é chamada tabagismo”, esclarece Valéria. Em outras palavras, o cigarro é uma droga, e deve ser tratado como tal. A consultoria realiza então um trabalho de conscientização e depois faz um tratamento para os profissionais da empresa que desejam parar de fumar. Geralmente, o programa tem a duração de dois anos. “Mostramos o impacto da dependência química na empresa e na sociedade, incluindo a questão familiar. Há ainda uma demonstração das conseqüências da doença, estatísticas e formas de tratamento”, afirma Valéria.
Fumante é menos valorizado no mercado de trabalho?
Para responder a esta questão conversamos com Luciana Martino, gerente de RH do Grufo Foco, consultoria de Recursos Humanos especializada em Recrutamento e Seleção. A profissional explicou que, se existirem dois candidatos com o mesmo perfil, as mesmas competências e um deles for fumante, o cigarro pode servir como critério de desempate, em favor do não-fumante. “Ainda é uma coisa velada, poucas empresas falam abertamente, mas a diferença existe”. Mas Luciana ressalta que isso depende muito do cargo e da empresa. “Para certas vagas operacionais e de produção, o fato de não fumar é pré-requisito, porque as pausas podem efetivamente atrapalhar a produtividade. Nesses casos, nós abordamos o assunto logo no começo da entrevista “, afirma.
Mesmo para as outras funções, cigarro geralmente aparece como empecilho para a contratação. “As pessoas precisam fazer uso do bom senso e não ficar saindo a toda hora para dar suas tragadas. Há um movimento geral em prol da qualidade de vida, e a moda hoje é não fumar”, comenta a gerente de RH.
Para o Dr. José Erivalder Guimarães de Oliveira, médico do trabalho e presidente do Sindicato dos Médicos de São Paulo, as empresas também têm a preocupação com os custos que um funcionário doente traz para a organização. O médico explica que um fumante está muito mais propenso a adquirir problemas cardíacos e pulmonares e até câncer. São problemas que envolvem gastos com plano de saúde e até com a recolocação de outro funcionário no futuro, no caso extremo de morte. “Não chegaria a dizer que o cigarro atrapalha o desenvolvimento profissional, mas que diminui a produtividade, faz mal à saúde e cria um ambiente desagradável para quem não fuma, quanto a isso não há dúvida”, afirma Dr. José Erivalder.
O médico ressalta ainda a questão do fumante passivo, que sem querer inala a fumaça do cigarro e acaba prejudicado pelo vício alheio. “O cigarro é um problema de todos aqueles que estão em um ambiente, fechado ou não, onde há alguém fumando. Mas vejo uma mudança gradativa nesse sentido, cada vez mais empresas e indíviduos tomam consciência dos males do cigarro para si próprios e para a sociedade”.
Segundo a Organização Mundial da Saúde, o tabagismo atinge 56 milhões de brasileiros e é responsável por 92% dos casos de câncer de boca e 90% dos tumores de pulmão.
Fumódromo pode ser a saída
No Grande Hotel Mercure, empresa do grupo hoteleiro Accor, um dos maiores do mundo, há um ano os funcionários fumantes têm um espaço reservado para darem suas tragadas, localizado em uma parte da garagem que não estava sendo utilizada. Mauro Kaluf, gerente-geral da empresa, conta que antes os fumantes se reuniam na porta do hotel para fumar, e acabavam causando um pouco de tumulto logo na entrada do estabelecimento. “Como também fumava na época, fui um dos grandes incentivadores da idéia de criar o fumódromo. É importante deixar claro que depois que começa a fumar, a pessoa vira dependente e é muito difícil parar de repente”, afirma ele, ex-fumante há pouco mais de um ano. Mas desde a “inauguração” do fumódromo muitas pessoas pararam de fumar e hoje o hotel tem 200 funcionários, sendo que cerca de 30% são fumantes.
A desaprovação social com relação ao cigarro pode ser comprovada pelo aumento da requisição de andares para não-fumantes no Hotel Mercure. O gerente geral afirma que o hotel tem 12 andares, com 30 apartamentos por andar. Hoje são cinco andares para não-fumantes e, de acordo com Mauro, a requisição de hóspedes por apartamentos nestes andares vem crescendo bastante. “Para transformarmos um andar de fumante em não-fumante é feito todo um trabalho pesado de limpeza de carpetes e cortinas, porque temos que eliminar todo e qualquer cheiro de cigarro existente”, afirma ele.
Cigarro é livre no fabricante
Na fábrica de cigarros Souza Cruz, é permitido fumar em toda a empresa, graças a um sistema de ventilação que permite a renovação do ar no ambiente a cada dois minutos. Segundo Mair Neto, gerente de Assuntos Corporativos da empresa, odisplacement ventilation é o sistema responsável por eliminar a fumaça do ar, insuflando o ar resfriado a uma altura de 30 cm do chão da sala e fazendo a exaustão pelo teto.
Mas será que o cheiro de cigarro vai embora mesmo? A resposta é sim, de acordo com duas funcionárias da companhia. Para Ana Lúcia Saraiva, que trabalha na Souza Cruz há 12 anos e nunca fumou, o fato das pessoas fumarem dentro da empresa não atrapalha. “Por mim, se houver uma ventilação adequada e a renovação de ar no ambiente, tudo bem. Não me incomodo nem um pouco”. Se Ana Lúcia, que não é fumante, não se incomoda, para os fumantes trabalhar na Souza Cruz é um grande prazer. É o caso de Maria Alice Tavares, que entrou na empresa como trainee, há sete anos, hoje atua como gerente da área de compras de matéria-prima e não consegue se imaginar sem suas tragadas durante o expediente. Fumante há 10 anos, Maria Alice afirma fumar meio maço de cigarros por dia, e diz que não pretende parar de fumar tão cedo. “É um dos poucos prazeres da vida. Fumo por prazer e não trabalharia em uma empresa que não me permitisse fumar”, diz ela.
Além de fumarem livremente, na Souza Cruz os adeptos do cigarro podem participar de um Painel de Especialistas, onde testam diferentes tipos do produto. Qualquer funcionário pode participar do Painel, que ocorre três vezes por semana, duas vezes por dia. “A pessoa não traga, ela analisa um conjunto de questões sensoriais – aroma, sabor, textura – para podermos obter as informações necessárias sobre o produto”, explica Mair Neto. Segundo ele, esse é o único momento em que os funcionários fazem testes dos produtos, sejam deles ou dos concorrentes. O profissional pode testar apenas dois cigarros por vez e são analisados três quesitos principais: aroma, gosto e fortidão – este último refere-se à intensidade do cigarro. Mair revela que, ao contrário do que se pode pensar, a maioria dos funcionários da Souza Cruz não é fumante. “Temos quase 5.000 funcionários, distribuídos entre a matriz no Rio de Janeiro e outras duas fábricas no interior. Apenas 30% desse total é fumante, uma parcela que representa a média brasileira”, explica Mair Neto.
Para o gerente de Assuntos Corporativos da Souza Cruz, a empresa é igual a todas as outras e os fumantes, sejam funcionários da Souza Cruz ou não, devem ficar tranquilos com relação às oportunidades profissionais, sem enxergar no cigarro um possível obstáculo para o desenvolvimento profissional.
Diferentemente dos Estados Unidos, onde vários ex-fumantes ou parentes de fumantes já falecidos entraram na Justiça contra a indústria do cigarro e ganharam, no Brasil a Souza Cruz já passou pela centésima ação indenizatória, e até hoje não perdeu nenhuma.
Casos de câncer no Brasil tendem a aumentar
O Instituto Nacional de Câncer (INCA) revelou, em maio deste ano, em um estudo intitulado “Estimativas da Incidência e Mortalidade por Câncer no Brasil em 2002” que revelou que seriam registrados, este ano, 337.535 novos casos de câncer, sendo 165.895 entre homens e 171.640 entre mulheres.
O câncer figura como a terceira principal causa de morte no país (12,32 % do total dos óbitos), superado apenas pelas doenças cardiovasculares e causas externas (acidentes de trânsito somados à violência urbana). Considerando ambos os sexos, o câncer de pulmão deve registrar o maior índice de mortalidade (15.955 óbitos). Os homens são as maiores vítimas desta doença: o estudo prevê 11.200 óbitos. Na população feminina, o câncer de mama é o tipo com maior índice de mortalidade, com uma previsão de 9.115 mortes.
O câncer de pulmão continua crescendo entre as mulheres, figurando como a segunda maior causa de mortes. O fumo é o principal causador de câncer de pulmão, responsável por 90% dos casos. O cigarro é, também, fator de risco para outros tipos de câncer: boca, laringe, faringe, pâncreas, rins, bexiga, colo de útero e esôfago.

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