Carreiras | Empregos

por Floriano Serra*
Sou capaz de apostar que, com poucas exceções, as ações não oferecerão nada de muito original, quer ver?
a) Distribuição de Cestas de Natal para os funcionários;
b) Distribuição de brinquedos para os filhos dos funcionários, conforme as faixas de idade;
c) Concurso entre as áreas, com prêmios para a mais bonita ou criativa Árvore ou Enfeite de Natal;
d) Churrascada ou jantar de confraternização, com troca de presentes do “Amigo Secreto” – depois de resolvida o eterno dilema: com ou sem a presença dos cônjuges?
Acertei? Pois é, como eu disse: nada de muito original. Não que as Cestas de Natal não sejam bem-vindas, assim como os brinquedos. Também não estou dizendo que os concursos internos não sejam motivadores. Quanto à churrascada ou ao jantar, tenho cá minhas dúvidas, mas deixa pra lá, não é sobre isso que eu quero falar agora.
O que hoje gostaria é de lembrar às empresas e particularmente aos responsáveis pelas políticas e práticas de Recursos Humanos que o mundo organizacional e as relações capital / trabalho estão mudando e que, portanto, está na hora de mudarmos também algumas formas e fórmulas antiquadas de buscar a boa qualidade do clima interno nas empresas.
Do modo como essas comemorações são tradicionalmente feitas, lembram muito aqueles abraços e beijos automáticos e ritualísticos que são trocados em reuniões e encontros formais: são dados de acordo com o figurino, mas sem um pingo de emoção verdadeira, de afetividade, de calor humano autêntico. É um mero atendimento da etiqueta. Tenho a sensação de que são assim essas comemorações de fim de ano na maioria das empresas. Com algumas honrosas exceções, essa festividade é vista e realizada apenas como mais um item a ser cumprido dentre vários outros da política social de Recursos Humanos.
Muito bem – e qual é a proposta?
A proposta é inovar, criar, surpreender e encantar o funcionário com atitudes, ações e programas que possibilitem a manifestação de emoções e sentimentos verdadeiros. Que tenha a cara de um caloroso encontro de pessoas. De gente festejando gente, sem discursos ensaiados de chefes no intervalo da música da churrascada ou após a sobremesa do jantar.
Fico imaginando coisas nada revolucionárias, mas certamente incomuns, como, por exemplo, o presidente de empresa – que muitos funcionários nem conhecem, nunca apertaram a mão ou com quem nunca trocaram uma palavrinha – fico imaginando esse homem poderoso passeando informal e descontraidamente pela fábrica, pelos corredores dos escritórios, parando um pouco nas portarias, no almoxarifado, na enfermaria, nas filiais de vendas e cumprimentando todo aquele pessoal que defende sua empresa e que, quando pode, faz a alegria dos acionistas. Imagino-o perguntando pela família do funcionário, pelos seus planos para as férias coletivas, querendo saber como ele conseguiu aquele machucado, elogiando o penteado, o sorriso, compartilhando alguma emoção que o colaborador venha a manifestar, coisas assim. Claro que quando digo “presidente”, também quero dizer diretor, gerente, chefe, supervisor – qualquer gestor. Por que penso nisso?
Que a qualidade das relações entre as pessoas nas empresas vai mudar, disso não tenham a menor dúvida. Detesto usar essa expressão, mas as empresas VÃO TER QUE mudar nesse aspecto. Lembram daquela música do Gonzaguinha que, dentre outros versos, diz: “chega de temer, chorar, sofrer / não dá mais prá segurar, explode coração! “?
Pois bem, os corações humanos estão prestes a explodir no ambiente de trabalho. Porque os bons profissionais já não agüentam mais tanta grosseria, tanta insensibilidade, tantos conflitos, tantas injustiças, tanta falta de paz, tanto mau humor principalmente por parte das chefias – como ainda acontece em um grande número de empresas, independente do porte, segmento ou nacionalidade. E esse sentimento não pode ser visto como mera rebeldia ou mania de reclamar. As pessoas simplesmente querem ser felizes, querem ter uma qualidade de vida e de trabalho mais digna e justa. Querem trabalhar PAZ.
Não pensem que estou exagerando: Ana Maria Rossi, presidente da ISMA-BR (International Stress Management Ass.), em pronunciamento publicado no jornal “Gazeta Mercantil”, edição de 25/07/02, afirma que “70% dos trabalhadores do Brasil sofrem de estresse e 30% deles estão no pior nível da doença, com tendências ao suicídio”.
No início deste ano, o jornal O Estado de São Paulo, edição de 06/02/2002, divulgou que “pesquisas internacionais centralizadas em Paris, mostram um preocupante aumento do número de suicídios ligados à vida profissional: demissões, reestruturações empresariais ou assédio moral no local de trabalho”, segundo Christian Larose, presidente do Departamento do Trabalho do Conselho Econômico e Social da França.
E ninguém vai ser tão ingênuo a ponto de ignorar que um dos principais responsáveis pela existência ou não desse estresse é o chefe imediato, qualquer que seja o título que seu cargo tenha: “Um monte de dinheiro e o bom nome da empresa certamente atraem os melhores profissionais – mas só atraem. O que os mantêm no emprego e determina sua produtividade é unicamente o seu superior imediato. Ele define, inspira e contagia o seu ambiente de trabalho”. Estas são conclusões de pesquisa feita há algum tempo por Marcus Buckingham e Curt Koffman, do Instituto Gallup, após entrevistas, durante anos, com mais de 1 MILHÃO de empregados e quase 100 MIL executivos de mais de 400 EMPRESAS de VÁRIOS PAÍSES.
Mês passado li neste site que “para cada duas demissões ocorridas no mercado, uma é gerada por incompatibilidade de convivência com o chefe imediato, segundo estudo realizado pela área de Executive Search da KPMG”.
Dito isto, voltemos ao tema inicial deste artigo, com uma pergunta para a reflexão do leitor: será uma polpuda Cesta de Natal, um atraente brinquedo para o filho, uma farta churrascada ou um lauto jantar na última semana do ano que vão fazer desaparecer ou ao menos cicatrizar as feridas abertas durante as 47 semanas anteriores?
Solidariedade, generosidade e alegria não deveriam ser marcas registradas apenas do Natal. Para os corações de boa vontade, que sabem o valor dos gestos de afeto, amizade, consideração e reconhecimento, o Natal é todo dia – como todo dia é o Dia da Secretária, Dia dos Pais, da Criança, dos Namorados e todos os demais para os quais você não precisa comprar diariamente nenhum presente: basta um sorriso amigo, uma palavra de apoio, um gesto de solidariedade – se puder, temperados com carinho e bom humor.
Aproveitando que Deepak Chopra esteve recentemente em São Paulo falando para mais de 4 mil empresários, vou concluir este artigo com uma sábia frase dele: “O sucesso inclui também saúde, energia, entusiasmo pela vida, relacionamentos compensadores, liberdade criativa, estabilidade física, emocional, bem estar e paz de espírito”. Por muitas e muitas razões, o Natal deste ano é uma oportuna e excelente ocasião para as empresas assinalarem o início das tão esperadas mudanças na busca do sucesso definido por Chopra.
Não me perguntem o que as empresas poderiam fazer para comemorar, de forma criativa, o Natal deste ano. Mais do que os neurônios, o coração dos profissionais de Recursos Humanos pode responder – ou, quem sabe, do próprio presidente da organização.
Só não vale dizer que não dá mais tempo para mudar os planos.
* Floriano Serra é colunista do Empregos.com.br, psicólogo, palestrante e Diretor de Recursos Humanos e Qualidade de Vida da APSEN Farmacêutica.

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