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Celson Hupfer, Managing Partner Consulting da Havik.
Um dos temas mais presentes na literatura atual e nos programas de desenvolvimento é a liderança. De um lado, organizações procuram pessoas que possam ser líderes; do outro, nós queremos compreender e melhorar nossas competências para nos tornarmos esses líderes tão procurados. Por isso, lemos biografias de grandes líderes, buscamos treinamento especializado, procuramos aconselhamento através de terapias, coaching etc. Convém, então, entender um pouco como esse assunto foi tratado ao longo da história e apresentar o que há de mais atual sobre o tema.
O estudo da história da liderança está presente no pensamento de praticamente todos os grandes filósofos e pesquisadores sociais. Maquiavel e Nietzsche, para citar alguns nomes, já estudavam termos como poder, autoridade e influência. As primeiras tentativas de desenvolver o tema utilizando o termo “liderança” foram feitas no começo do século passado, sendo um dos seus principais precursores o cientista social Max Weber, que definia três tipos de liderança: a patriarcal ou patrimonial, a carismática e a burocrática. A primeira refere-se àquela que é de certa forma transferida de pai para filho e que está vinculada à propriedade dos meios de produção. A liderança carismática, por sua vez, teria uma inspiração quase divina e se caracterizaria por dons especiais que certos indivíduos possuem e que fariam deles seres capazes de mudar o seu mundo e o dos outros. A liderança burocrática, por fim, seria aquela que ocorre dentro das organizações, algo como uma liderança delegada ou atribuída em função do cargo que um indivíduo ocupa.
Depois desses primeiros estudos, muito se produziu em termos de tentativa de compreender a liderança. Ela foi associada inicialmente a traços e características pessoais dos indivíduos na posição de líderes (estudou-se praticamente tudo, desde atributos físicos, como altura, peso e características faciais, até características de personalidade, como extroversão, conservadorismo, empatia e dominação). Apesar de haver grande correlação entre características individuais, não se conseguiu chegar a conclusões e, principalmente, não se conseguiu explicar porque alguns indivíduos, mesmo com todas as características para se tornarem líderes, não ocupavam posições de liderança. Além disso, se a liderança fosse uma questão de personalidade ou qualidades físicas, como poderíamos desenvolver líderes? Mesmo assim, até hoje este tipo de abordagem está nos nossos corações e mentes, pois corresponde à nossa concepção de que líderes são pessoas especiais e que fazem coisas especiais.
Outros estudos decidiram se concentrar no que os líderes fazem, em vez de no que os líderes são. Assim, surgiram as teorias de liderança comportamental e de estilos de liderança, entre outras. A grande maioria dos trabalhos concluiu que dois comportamentos de liderança são fundamentais: um voltado para a execução da tarefa (aparecem aí comportamentos de iniciar a ação, planejar as atividades, distribuir responsabilidades e definir os objetivos) e outro voltado para as pessoas e os relacionamentos (como interessar-se pelas questões de cada um, promover o relacionamento entre as pessoas, gerar um clima de camaradagem e cooperação). São teorias que têm um grande apelo, porque permitem o desenvolvimento das pessoas nos seus papéis de liderança.
Uma outra corrente define ainda que a liderança é situacional, ou seja, que ela deve ser adaptada de acordo com cada situação, que entende-se tanto pelo grau de dificuldade da tarefa ou objetivo, quanto pelo nível de comprometimento e competência do grupo. Em outras palavras, cada situação exigiria um tipo de liderança diferente, e alguém que é líder numa situação poderia ser seguidor em outra.
Uma das teorias de maior apelo atualmente é a denominada Liderança Transformacional. Apesar de não existirem ainda no Brasil suficientes programas de desenvolvimento baseados neste conceito, esta teoria é a que mais gera trabalhos científicos em revistas importantes sobre liderança, como a The Leadership Quarterly. Vale a pena entender como ela funciona e o que ela propõe.
Em primeiro lugar, é uma teoria que pretende trazer uma resposta às questões do mundo contemporâneo, no qual as coisas mudam o tempo todo e a velocidades sem precedentes. Nesse mundo extremamente dinâmico, mais do que simplesmente uma ocupação ou um meio de ganhar a vida, as pessoas têm buscado dar significado às suas ações e seu trabalho. O recurso crítico é o conhecimento: não porque esteja em falta. Muito pelo contrário, ele está disponível para todos, mas precisa sim ser encontrado e utilizado de forma adequada. A globalização impõe necessidades de adaptação para lidar com a diversidade, tanto de consumidores quanto de indivíduos nas organizações e outros meios. A liderança é definida como um processo de interação pelo qual um ou alguns indivíduos buscam influenciar outros para a realização de objetivos comuns. O que isso quer dizer é que a liderança nada mais é do que um processo de interação da influência, o que significa ser recíproca, mútua e ter a existência de objetivos comuns como condição sine qua non, objetivos este que são compartilhados e podem ter sido definidos ou pelo próprio líder, ou por um grupo ou mesmo por uma organização.
Como o próprio nome diz, a Liderança Transformacional pretende transformar pessoas e fazer com que elas realizem mais do que se esperava delas. Ela não se preocupa somente com o desempenho da organização, da área ou do grupo. Envolve também desenvolver as pessoas, buscar a realização das suas necessidades individuais, ao mesmo tempo em que estas realizam os objetivos da organização. Neste sentido, ela tem componentes que abrangem preocupação com questões éticas mais amplas, como a comunidade em que a organização se insere, como a sustentabilidade, entre outras questões muito caras a nós atualmente.
Um dos principais modelos de Liderança Transformacional foi desenvolvido por Bernard Bass e envolve, além de quatro componentes transformacionais, um componente transacional. Os cinco componentes principais do modelo de Bass são os seguintes:
Influência Idealizada – também denominada de carisma, refere-se à capacidade do líder de demonstrar comportamentos éticos e morais. Está correlacionada com a habilidade de fornecer visão e um senso de missão aos seguidores.
Motivação Inspiracional – a inspiração refere-se à capacidade dos líderes de inspirar e motivar suas equipes a realizarem mais do que estariam dispostas inicialmente.
Estimulação Intelectual – refere-se à capacidade dos líderes de estimular nos liderados desejos por criatividade, inovação e conhecimento. Para tanto, o próprio líder deve possuir esses desejos.
Consideração Individualizada – o líder precisa ser capaz de prestar atenção às necessidades individuais de cada um dos membros de sua equipe. Reconhecer que cada um é um sujeito diferente e que necessita, portanto, de uma atenção diferenciada.
Recompensa Contingenciada – este é o fator transacional, pelo qual o líder promete aos seus seguidores determinadas recompensas (melhores salários ou promoções, por exemplo) em troca de um desempenho melhor.
Algumas observações são importantes: (1) para o líder ser eficaz, ele deve possuir um ou mais desses comportamentos ou características; (2) as correlações observadas em pesquisas entre os diversos fatores e o desempenho da liderança (medida tanto em termos de resultados da tarefa quanto em termos de satisfação das equipes), demonstram que os fatores transformacionais são mais fortes e mais duradouros do que os da recompensa contingenciada; (3) por ser uma teoria comportamental, os autores acreditam na possibilidade de desenvolvimento dos líderes.
E o que isso significa para nós? Como podemos nos desenvolver para sermos líderes desse novo mundo em transformação?
Primeiro é preciso saber o quanto estou disposto a dar de mim para ser um líder nesse novo ambiente, pois ele exige grande desprendimento de meus interesses próprios e uma preocupação fundamental com as pessoas, com a sua transformação e com os impactos das minhas ações e comportamentos sobre essas mesmas pessoas e sobre a comunidade como um todo, o que inclui clientes, fornecedores, acionistas e a sociedade em geral.
Segundo, é preciso gostar de lidar com gente. E gente diferente. É bom deixar isso claro, pois tem muita gente que prefere agir sozinho, que acha que as pessoas só são boas se forem parecidas consigo, que não aceitam a diversidade e, muito menos, não percebem que a diversidade é fundamental para que se possa enxergar as questões sob diversos olhares.
Terceiro, é preciso estar preparado para uma mente alargada, como diz o filósofo Luc Ferry (Aprender a Viver). Ou seja, estar disposto a conhecer mais sobre o mundo, deixar de ficar preso apenas aos conhecimentos técnicos da função. Todo conhecimento, não importa de onde venha, pode ajudar.
Quarto, é preciso saber que este tipo de liderança envolve padrões de comportamento moral que servem de exemplo para as equipes, como ética nas relações com os clientes, fornecedores e governos, justiça nas relações com subordinados, cultura de meritocracia e respeito às individualidades.
Enfim, se você está disposto a tudo isso, você não será apenas um líder para o novo mundo. Você será também uma pessoa especial, ou, como diriam os antigos filósofos, uma pessoa boa. E a grande questão da vida não é ser o melhor, o ótimo: é ser bom, ter uma vida boa, o que quer que isso signifique para cada um!

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