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Durante minha infância, no Bairro do Rosário em Ouro Preto, uma das maiores diversões da criançada era brincar no “areião”. Este acidente geográfico, situado num dos inúmeros morros da cidade, era uma duna feita de uma areia muito fina usada pelas donas de casa da vizinhança na limpeza das panelas.
A areia servia para a molecada escorregar, pular e fazer guerra. Eu gostava de mexer com a areia e vê-la fazer um frenético movimento só interrompido quando a lei da gravidade estava completamente satisfeita. Antes disso só restava a opção de dar um novo toque para gerar uma mudança no movimento.
O movimento da globalização segue a mesma lógica. Ele somente será interrompido quando as diferentes forças que interferem na economia e nas relações sociais encontrarem uma nova posição de equilíbrio. Além disso, têm ocorrido, a todo instante, novas mudanças políticas, sociais ou econômicas cuja conseqüência é mais variedade e aceleração do movimento.
Durante as primeiras nove décadas do século XX houve uma evolução constante nas condições de trabalho e no relacionamento entre patrões e empregados. As mudanças econômicas mais favoreceram do que atrapalharam a evolução gradual e segura dos direitos dos trabalhadores.
No início da década de 90 o mundo do trabalho encontrava-se num razoável estágio de evolução. A expectativa dos especialistas era que continuasse a melhorar ainda que se esperasse um ritmo menor nos países desenvolvidos do que nos outros.
Todos que apostaram nisso viram frustradas suas expectativas. Apesar de alguns fatos positivos, a globalização fez recuar a qualidade das relações de trabalho em todas as partes do Mundo.
A necessidade das empresas reduzirem seus custos, a disponibilidade de mão-de-obra farta e barata nos países menos desenvolvidos e o crescimento do desemprego derrubaram as previsões dos sindicalistas europeus que, na década anterior, sonhavam em exportar suas tecnologias de mobilização para o Terceiro Mundo.
Em 1988, durante visita de estudos que fiz à Itália, um dirigente da CGIL, a maior e mais antiga central sindical daquele país, explicou-me a sua estratégia. “Vamos atacar os patrões no seu território de expansão, ajudando os nossos colegas da América Latina a obter condições de trabalho semelhantes às nossas”. Depois, dizia ele, retomaremos as pressões na Europa.
Hoje a onda de desregulamentação atinge todos os quadrantes, abalando mesmo os fortes alicerces getulistas da cultura brasileira de relações no trabalho, como se viu na recente aprovação pela Câmara dos Deputados da reforma da CLT.
Ao contrário do que previa o sindicalista italiano, o Terceiro Mundo, além de produtos baratos, vem exportando para os países mais avançados um modelo de direitos sociais mínimos ou, como preferem os críticos mais veementes, a precarização das condições de trabalho. Ocorre uma espécie de desenvolvimento social ao contrário.
Mas os trabalhadores não receberam apenas os espinhos da globalização. O capitalismo do conhecimento impôs as empresas uma nova exigência. Para sobreviver num mercado que exige produtos e serviços com qualidade crescente e preços cada vez menores, elas dependem da contribuição dos empregados de todos os escalões.
Na medida que se posicionam como diferencial competitivo, os trabalhadores conquistaram mais liberdade para planejar e executar suas tarefas, mais independência para tomar decisões e colhem os benefícios do aumento dos investimentos das empresas na educação e treinamento. Se, coletivamente, eles perderam conquistas trabalhistas, individualmente ganharam o aumento da empregabilidade e os programas de participação nos lucros e resultados da empresa.
Ainda não é possível vislumbrar um cenário claro e definitivo para as relações de trabalho. Os liberais clamam pelo aprofundamento da desregulamentação. Os opositores das mudanças vão às ruas em todos os continentes, usando as vitrines dos fóruns internacionais de economia e comércio, para manifestar seu inconformismo diante do atual modelo econômico. Resta somente uma certeza: parece haver ainda muita areia para se mover na duna da globalização.

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