Carreiras | Empregos

por Rogério Kiefer
Ainda que associada à idéia de descanso e recomeço, a palavra “aposentadoria” soa ameaçadora para muitos profissionais. Ainda mais para executivos acostumados ao status e mordomias de quem vive no topo da hierarquia corporativa. Para eles, afastar-se do trabalho depois de 30 ou 40 anos pode ser um golpe muito duro. “Tive gastrite e dores de estômago ao me aproximar dos 60 anos, idade limite para sair da empresa”, conta Jones Debertoli, que se aposentou há três anos, depois de mais de quatro décadas de trabalho no Grupo Randon, de Caxias do Sul (RS). Apesar do temor inicial, Debertoli superou bem a mudança. Fez um acordo com o presidente da companhia, Raul Randon, criou o próprio negócio – uma consultoria – e seguiu prestando serviços para o antigo empregador.
Apesar de raros, já que nem todos os egressos de uma companhia podem seguir atuando como consultores, casos como o de Debertoli mostram que há meios de diminuir o impacto da aposentadoria. Empresas e consultorias já oferecem projetos específicos para apoiar aqueles que estão em vias de encerrar a carreira. Embora ainda raros no país (veja o quadro “Quem ganha com os veteranos”), esses programas agem na raiz dos problemas ligados à aposentadoria: tentam evitar que os profissionais sejam pegos de surpresa. “Quando chega a hora, muitos dizem eu sabia que ia acontecer, mas não imaginava que seria agora”, conta Ana Fraiman, psicóloga e diretora da A.P. Fraiman Consultoria. “Na realidade, as pessoas evitam a idéia de que um dia terão de parar. Elas só pensam no problema quando ele é inevitável”, concorda Monika Staudacher, consultora de pós-carreira do braço brasileiro da multinacional DBM.
Hoje, com a rotina atribulada dos negócios, os profissionais se mantêm tão concentrados no dia-a-dia que, muitas vezes, esquecem de pensar no futuro. O deslize, aliás, só tende a se agravar. “Com a melhoria da qualidade de vida e dos serviços de saúde, o aumento da expectativa de vida dos brasileiros é um fato consumado”, explica o consultor Renato Bernhoeft. “Assim, em alguns casos, o período pós-aposentadoria é quase tão longo quanto o de atividades profissionais.” O período prolongado de aposentadoria também cria um ponto de confronto com o perfil do mundo dos negócios. Hoje, as empresas preferem contratar profissionais jovens. Isso, segundo Bernhoeft, torna as carreiras de executivos cada vez mais curtas – e diminui os espaços para os veteranos.
A boa nova é que já foram identificados os problemas mais comuns que tiram o sono dos profissionais recém-aposentados. E o melhor: há uma série de ações e iniciativas simples que podem ser colocadas em prática para afastar a ansiedade típica desse momento. O essencial, explica Monika Staudacher, da DBM, é mudar o jeito de ver a vida e criar um projeto para os anos de afastamento do batente. “A pessoa precisa deixar de olhar só para o trabalho e pensar na vida, nos amigos, na família, nas coisas que gosta de fazer fora da empresa. Precisa também planejar novas atividades”, aconselha.
Esses novos passatempos, que podem incluir atividades remuneradas, variam conforme os valores de cada um. Para quem acha que já fez o suficiente, por exemplo, os planos pós-carreira devem incluir atividades tão variadas quanto cursos de línguas, pintura, marcenaria, trabalhos voluntários ou a formação de um grupo de viagens. Para manter o estresse à distância, vale ainda evitar os ofícios remunerados. Por outro lado, quem sente a necessidade de trabalhar mesmo na terceira idade pode procurar um novo emprego ou criar a própria empresa. Mas, ainda assim, deve buscar satisfação também no lazer. E, principalmente, não arriscar a segurança financeira (entrando em um negócio de alto risco, por exemplo).
Outra providência importante, acrescenta Monika, da DBM, é reunir o máximo possível de informações antes de planejar o que fazer. “O profissional precisa fazer uma avaliação de quesitos objetivos de sua vida”, diz ela. O check-list inclui finanças, estado de saúde, interesses (‘o que gosto de fazer?’), aspirações (‘onde quero chegar?’), características de personalidade e a qualidade dos relacionamentos extra-profissionais – com a família e com os amigos, principalmente. Só a partir daí, explica ela, é possível pensar em um plano para o futuro com chances de sucesso. Sem esse levantamento prévio, o pré-aposentado pode criar problemas para si mesmo. Por exemplo, ao planejar fazer coisas das quais nunca gostou, mas que se mostram atrativas à primeira vista.
Parece bobagem – Para quem ouve conselhos como esses aos 27, 30 anos – quando ainda é hora de arregaçar as mangas e correr atrás do sucesso –, tudo pode parecer bobagem. “Quando jovens, todos pensam apenas em crescer profissionalmente”, ilustra a assistente social Maria Lúcia Beger. A aposentadoria, muitas vezes, é vista como algo distante, que representará a libertação de horários e da rotina. “Algum tempo depois de conquistarem essa liberdade, porém, muitos passam a apresentar um sentimento de inutilidade”, completa a autora do estudo “Aposentados e Livres… Mas para Quê?”, feito a partir de entrevistas com funcionários com mais de 40 anos de idade da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (USP).
Não se preocupar com a aposentadoria, aliás, pode gerar outro grande prejuízo para os jovens. Ao pensar apenas na carreira, eles se afastam das mulheres e dos filhos, o que dificulta a aproximação no futuro. Testemunha de alguns confrontos desse tipo, Renato Bernhoeft conta que muitas vezes ouve filhos e esposas de aposentados reclamarem algo como “quando precisávamos, você não estava aqui. Agora, quer recuperar o tempo perdido por causa da aposentadoria”. Geralmente, diz o consultor, o afastamento entre o profissional e a família já é tão grande que dificulta a tentativa de reaproximação. “Há coisas que não se pode recuperar. Não é possível, por exemplo, corrigir episódios como a ausência no aniversário de um filho”, explica Bernhoeft. Ana Fraiman segue a mesma linha: “Muitas vezes, o profissional trabalhou para crescer na carreira e garantir a qualidade de vida da mulher e dos filhos. Mas ele próprio não participou dessa vida – e os familiares se acostumaram a viver sem ele”.

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