Por João Prado
Aos 63 anos de idade, o economista Marcos Cintra tem um desafio importante pela frente. Nomeado pelo prefeito Gilberto Kassab como secretario do trabalho de São Paulo, Cintra tem a missão de amenizar os impactos da crise financeira nos empregos da maior cidade do país e criar melhores oportunidades de trabalho para os cidadãos.
Convenhamos que se trata de uma tarefa nada fácil. “Entrei no olho do furacão, em um momento difícil”, afirma. Mas Cintra também está otimista, ao menos como demonstrou na entrevista que concedeu à reportagem do Empregos.com.br. Cintra diz que, apesar do medo da crise ser contagioso, tem a certeza de que não somente São Paulo, mas o Brasil todo passará pela crise com menos danos do que as pessoas imaginam.
Deve-se dizer, no mínimo, que Cintra tem knowhow para fazer suas previsões. Vice-presidente da Fundação Getúlio Vargas, doutor em economia pela Universidade de Harvard (EUA), Cintra é apontado por muitos como um profundo conhecedor técnico da macroeconomia. Entre outras coisas, é o criador do projeto Imposto Único, que é tido por especialistas como a solução mais viável para uma reforma tributária séria no Brasil.
Nessa entrevista, Marcos Cintra conta um pouco sobre a sua carreira, sobre seus projetos para a cidade de São Paulo e manda o recado: “Passaremos bem pela crise e sairemos ainda mais fortes”. Torcemos por isso.
Boa Leitura!
Empregos.com.br – Como foi o começo de sua carreira?
Marcos Cintra – Minha formação é de economista. Morei doze anos nos EUA, onde fiz minha faculdade e pós-graduação. Quando voltei para o Brasil, fiz um concurso na Fundação Getúlio Vargas e assumi a cadeira de professor de economia, até chegar ao posto de vice-presidente. A minha carreira em si é essa. Já a minha história na política é bem atípica, sendo que não teve início na vida universitária, que é o começo natural da maioria dos políticos. Entrei tardiamente, em 1992, convidado por causa do meu conhecimento técnico. Tudo começou em 1990, quando o então candidato a governador Paulo Maluf me chamou para ser secretário de planejamento do governo dele (Nesta eleição, Paulo Maluf não foi eleito). Foi uma coisa polêmica na época, sendo que tinha uma visão bem diferenciada da dele. Na verdade eu nunca fui malufista, mas o meu relacionamento com ele me proporcionou a entrada na vida política. Em 1992, voltei a realizar o plano de governo do Maluf e foi quando ele se elegeu prefeito. O resumo é que a minha trajetória política está muito relacionada à minha trajetória profissional. Eu nunca fiz da política uma profissão. Ao contrário, foi como economista que me levou a ser convidado. Eu me descrevo como um técnico que virou político.
Empregos.com.br – O senhor já ocupou outros cargos públicos. Como é trabalhar a frente da secretaria municipal? E quais são os principais desafios?
Marcos Cintra – Para mim é um desafio totalmente diferente. Como economista sempre me preocupou mais as questões macroeconômicas, como reforma tributária e finanças públicas. Atuar na área do trabalho é uma novidade. Particularmente entro na secretaria em um momento complicado, sendo que a questão do emprego está no olho do furacão. Um fato novo é que, pela primeira vez, a secretaria do trabalho está atrelada à pasta de desenvolvimento econômico. A lógica é simples: O desenvolvimento da economia é o que trará mais oportunidades de empregos para o cidadão. Só teremos mais oferta de empregos se tivermos um bom plano de desenvolvimento econômico. Estou satisfeito com o trabalho que tenho pela frente.
Empregos.com.br – Existe um temor de que a crise financeira nos EUA possa afetar os empregos no Brasil, especialmente no primeiro semestre. Como São Paulo está se preparando para superar qualquer adversidade como essa?
Marcos Cintra – Em uma análise mais ampla, acho que está se criando uma espécie de neurose com a crise. O medo é contagioso, porque passa para todas as pessoas. A crise realmente é feia, mas nos EUA e na Europa. Não sou adepto da teoria do deslocamento, que vivemos isolados do mundo e por isso a crise não vai nos afetar. Não é isso! Apenas acho que a nossa crise será menos grave do que muita gente está antecipando. Digo isso porque, em primeiro lugar, a crise internacional foi causada pela quebra dos bancos, ou seja, desestruturou o crédito principalmente nos EUA. O americano funciona na base do crédito, ele não poupa. Já o brasileiro vive ainda da poupança, aqui os bancos financiam com mais prazo e são mais rigorosos para liberarem o crédito. Os critérios aqui são mais rígidos e dessa forma a crise de crédito no Brasil não será tão grave. Em segundo lugar, nossa economia é fechada. O Brasil ainda depende pouco do comércio exterior, comparado aos países europeus. Não estou minimizando a crise, mas acho que ela ficará no Brasil em setores exportadores, como a indústria do automóvel. Entraremos em um período de desaceleração, mas não recessão. No caso de São Paulo especificamente, que é uma cidade baseada na prestação de serviços, creio que a crise será de menor impacto. A partir de março, o número de desempregados poderá aumentar, mas acho que será uma crise passageira para os brasileiros de uma maneira geral. E passaremos bem por ela!
Empregos.com.br – Dizem que o paulistano tem uma relação diferente com o trabalho do que os demais brasileiros. Concorda com isso? E qual é a relação das pessoas que moram em São Paulo com o trabalho?
Marcos Cintra – Até pelo dinamismo que foi construído na economia em São Paulo , o paulistano tem uma relação forte com o trabalho. Mas acho que o brasileiro em geral tem essa relação. E justamente por sermos um povo criativo, acho que passaremos por toda essa crise de maneira mais tranqüila do que em outros países. E em São Paulo está um pouco de todo o Brasil e todo o mundo, por isso acho que o paulistano tem essa característica trabalhadora.
Empregos.com.br – O que um jovem paulistano precisa fazer para conquistar o seu primeiro emprego? E quais as oportunidades que a prefeitura e a cidade como um todo oferecem para ele?
Marcos Cintra – A prefeitura tem uma grande preocupação, principalmente nas faixas onde o desemprego é maior. Em relação aos jovens temos alguns projetos prioritários, focado na capacitação e qualificação. É importante que os trabalhadores de uma maneira geral saibam que a prefeitura tem uma estrutura que pode ajudar muito para arrumar um emprego. Isso pode ser visto através do telefone 156 e também nos nossos centros de apoio, que estão espalhados por toda a cidade. Nós temos hoje um conjunto de 15 mil vagas não preenchidas. Portanto, há disponibilidade de emprego, mas acontece que muitas vezes as pessoas não se ajustam à característica técnica dessas vagas. Por isso são importantes nossos programas de capacitação.
Empregos.com.br – A prefeitura tem algum projeto para facilitar a abertura de novos negócios e a vida dos profissionais autônomos?
Marcos Cintra – Temos um programa que se chama Câmara de Animação Econômica. Trata-se de um projeto que está desenvolvido em alguns setores da cidade, mas que queremos estender para toda a capital e em todas as subprefeituras. Esse programa busca incentivar as pessoas a abrirem seus próprios negócios, reunindo-as em grupos de interesses e com oferta de capital inicial. Hoje em dia não podemos mais falar de emprego, mas sim de trabalho. O número de pessoas empregadas com carteira assinada cada vez mais diminui, ao passo que o número de profissionais autônomos aumenta.
Empregos.com.br – O senhor é idealizador do projeto do Imposto Único, enquanto foi deputado federal. Como está a situação desse projeto?
Marcos Cintra – Apresentei esse projeto em 1990 e já vão 18 anos desde então. Nesse período, o projeto passou a ser amplamente discutido pela sociedade brasileira. O Imposto Único é a única alternativa viável para se realizar uma reforma tributária séria no país. Não é por nada que tanto o governo anterior como o atual estão dando cabeçadas e não conseguem achar outra solução para este sério problema. Quando fui deputado federal, entre 1999 e 2003, apresentei o projeto na Câmara dos Deputados e ele foi aprovado por unanimidade na comissão de justiça e na comissão da reforma tributária. Portanto, se o Imposto Único precisar de uma votação para entrar em vigor, hoje isso já poderia acontecer. Tudo depende de duas coisas: Vontade política e pressão da sociedade. Pretendo trabalhar para que esse projeto entre em vigor e que seja convocado um plebiscito. O governo precisa dar uma satisfação para a sociedade ou então que deixem os cidadãos opinarem se quer ou não o Imposto Único.
Empregos.com.br – O senhor terá cerca de 1400 dias a frente da secretaria do trabalho. O que o paulistano pode esperar da sua administração?
Marcos Cintra – Essa administração já foi testada e está em segundo mandato. O primeiro mandato já foi reconhecido pela sociedade, tanto que foi reeleito por uma ampla maioria de maneira bastante confortável. O prefeito Kassab tem se mostrado um líder notável e um grande administrador. Mas não reivindico nenhum mérito do que foi realizado, pois estou chegando agora. Os paulistanos podem esperar o meu empenho para que o trabalho continue e se aprimore. Estou orgulhoso em ser secretario do trabalho de uma cidade tão importante como São Paulo.
No olho do furacão
Secretario do trabalho de São Paulo conta, em entrevista, sobre os seus projetos para a cidade e como pretende combater o desemprego
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