Carreiras | Empregos

Você gosta do que faz? De verdade? Seus olhos brilham quando você chega em casa e vai contar para a família como foi seu dia, os projetos que realizou, as metas que atingiu? Se este não é o seu caso, saiba que você não é o único. São poucas as pessoas que encontram realmente paixão naquilo que fazem, mas são justamente elas exemplos de profissionais bem-sucedidos, tanto no campo pessoal quanto o profissional. Veja os exemplos ilustres de Antônio Ermírio de Moraes, Abílio Diniz (da rede Pão de Açúcar), a empresária Milú Vilela, a escritora Maria Adelaide Amaral, entre outros.
A possibilidade de fazer o que se gosta e unir prazer ao trabalho diário pode trazer, além de muita felicidade, entusiasmo e qualidade de vida, ganhos expressivos também financeiramente. É o que afirma Mark Albion, autor do livro “Making a Life, Making a Living”, ainda sem tradução para o português. Albion concedeu recentemente uma entrevista à Revista Você S.A., onde comentou a pesquisa que realizou sobre o assunto. Ele investigou a vida de 1.500 profissionais que obtiveram seu diploma de MBA (Master in Business Administration) nas melhores escolas americanas há 20 anos. Quando fizeram sua primeira opção de emprego após o curso, 83% (1.245 pessoas) afirmaram que ganhariam dinheiro primeiro, para depois fazer o que realmente desejavam. Escolheram o emprego por causa do salário. O restante, 17%, disse que faria aquilo que realmente lhe interessava, independente da questão financeira. Vinte anos depois, os resultados são surpreendentes: entre os 1.500 pesquisados, Albion encontrou 101 multimilionários. Apenas um deles pertence ao primeiro grupo. Os outros 100 faziam parte do segundo, de 255 profissionais que seguiram sua paixão. A experiência mostra que as chances de ficar milionário fazendo o que se gosta são 50 vezes maiores de quem trabalha apenas para ganhar dinheiro.
O fato é que esse conceito de trabalhar fazendo o que gosta é relativamente novo. Até meados da década de 80, o trabalho era visto como uma forma de ganhar dinheiro – e só. “As pessoas escolhiam que carreira seguir pensando nas possibilidades de ganhar mais, sem saber que na verdade o dinheiro é só uma conseqüência de um trabalho bem feito, principalmente quando é feito com prazer”, analisa a psicóloga Rosângela Casseano. Somente nos últimos anos as pessoas começaram a ter uma preocupação maior com as suas carreiras e verdadeiros interesses profissionais, o que levou a uma procura por testes vocacionais e terapeutas que trabalhem com orientação profissional. “Hoje já existe uma infinidade de serviços para orientar os recém-formados e quem quiser informações sobre carreiras e profissões: são sites, universidades, pesquisas e estudos, terapeutas. Você tem menos chances de errar e fazer aquilo que não gosta”, diz Rosângela.
Parecem ser características intrísecas dos profissionais que fazem o que gostam e são realizados no trabalho a automotivação e a capacidade de fazer as coisas acontecer. Para Lúcia Bobadilha, gerente de marketing e desenvolvimento da Atta – marca da GR Serviços de Alimentação, especializada no desenvolvimento de soluções personalizadas para o setor de alimentos em indústrias e empresas, a automotivação é uma de suas características mais marcantes. “Sou conhecida na empresa por estar sempre motivada e disseminar esse entusiasmo pelo ambiente de trabalho, mas acho que isso é meu mesmo, nunca foi forçado”.
A nutricionista confessa que sempre foi uma apaixonada pela alimentação e pelo ato de servir as pessoas, tradição que vem da família, que também trabalhou na área. “Para mim é um grande prazer servir alguém, seja um simples cafezinho ou uma refeição para 10 mil pessoas. Tenho a função como nobre, tanto que no momento estou escrevendo um livro sobre o assunto”, afirma. Lúcia considera que, para manter a paixão acesa, seja pela Nutrição ou qualquer outra profissão, é preciso cultivar e alimentar esse amor. “Estou sempre escrevendo, lendo livros, me atualizando. E como faço o que gosto, isso não é martírio algum, mas uma forma de encontrar ainda mais prazer no trabalho”.
A culpa também pode ser da empresa
“Infelizmente, a maioria das pessoas ainda espera o expediente terminar para fazer o que gosta”, afirma Simon Franco, presidente da consultoria TMP Worldwide. O conceito de sucesso, para ele, é de alguém que tinha seus obetivos iniciais e consegue alcançá-los ou superá-los. “Ser bem-sucedido é bem diferente de ser rico, apesar das duas coisas estarem relacionadas”. É difícil ver alguém bem-sucedido que não tenha ficado rico, mas o contrário é possível: você pode ter rios de dinheiro mas ser infeliz no trabalho e ter ganho o dinheiro por outras vias – uma herança, por exemplo.
Segundo Simon, o fato de você trabalhar no que não gosta também pode ser culpa da empresa, e não só do profissional ou do mercado. Às vezes, o profissional até faz o que gosta, mas está no lugar errado e na hora errada. “Uma coisa leva a outra: os profissionais são mal selecionados e não estabelecem uma ‘química’ com a organização. O grande problema é que as pessoas ainda são contratadas pelo que elas têm (cursos, MBA, experiência), mas acabam demitidas pelo que elas não são (líderes, gerentes, proativos, empreendedores)”.
“Trabalho no que gosto, mas boa parte desse amor devo à empresa que trabalho, que me dá oportunidade de crescer e oferece todas as ferramentas para eu desenvolver o meu trabalho da melhor forma possível”, afirma Cláudio Bannwart, gerente de segurança digital da Compugraf. O profissional tem 37 anos e trabalha na área desde 1981, época que os micros da Apple começaram a ser fabricados. Ele fez Matemática Aplicada Computacional na Unicamp, e se autodenomina um apaixonado pelas novas tecnologias. Primeiro foi a computação gráfica, que Cláudio conheceu ainda na Faculdade. “O sistema de Computação Gráfica da Unicamp estava começando, e desde o início fazia de tudo para aprender mais, todo o meu tempo e dinheiro usava para comprar revistas da área e fazer cursos. Foi um tempo difícil, mas sem dúvida fundamental para o meu aprendizado”, acredita ele. Depois veio a Segurança Digital, área que também atraiu Claúdio logo de cara e onde trabalha até hoje. “Ainda não estou plenamente realizado. Meu sonho é um dia trabalhar com pesquisa e ser palestrante, estudando as novas tecnologias para depois passar para as outras pessoas”.
Robert Kriegel, autor do livro Ganhar mais e Trabalhar menos, lançado este ano pela Editora Campus, considera que alcançar o sucesso não é tão difícil assim. Basta estar no lugar certo e na hora certa, fazendo algo que realmente lhe dê prazer. “Para ter sucesso nesses tempos de rápidas mudanças – seja você um empreendedor ou alguém em plena escalada corporativa- é necessário desafiar os velhos modos, mitos e estados de espírito, e repensar, redefinir e reinventar a filosofia do seu negócio”. O autor aconselha que talvez você não precise de um trabalho diferente, mas de uma nova forma de pensar e fazer as coisas. “Não estou sugerindo que você mude o seu jogo, e sim o modo de jogar”, opina ele.
Faça valer a pena
Simon Franco é um exemplo de profissional que ama o que faz e é muito bem-sucedido. Com mais de 30 anos de carreira, Simon afirma que ainda tem muito que aprender e não aceita ser chamado de guru: “Para mim guru é aquele cara que não é mais, que já deu toda a contribuição que tinha que dar. Eu estou bem longe disso, ainda mantenho o tesão de querer fazer melhor a cada dia”. Com um filho de 38 anos e outra de apenas 4, Simon acredita que sempre vale a pena recomeçar. “Eu tenho 66 anos, mas a minha grande motivação é saber que vou chegar em casa e vou poder brincar e aprender muito com a minha filha. Sempre digo que a vida é muito curta, portanto devemos fazer de tudo para que ela seja divertida, tem que valer a pena”.
Esse lema é seguido à risca por Julio Freire, de 27 anos, que trabalha como dublê em filmes e novelas. Ele começou como ator aos 18 anos, mas desde os 23 vem se especializando na técnica de forjar acidentes, lutas e quedas. “Isso aqui é o paraíso. Gosto de tudo e me divirto muito”. Ele afirma que, apesar de trabalhar sob pressão e lidar com o perigo diariamente, vê a profissão como outra qualquer. “É como o trabalho de um policial, um bombeiro. Você acaba se acostumando com situações-limite e passa a gostar disso. A adrenalina é sempre alta, o dia inteiro, apesar de ser tudo extremamente calculado, para que nada dê errado”.
Julio começou meio que por acaso, quando conheceu um profissional que já trabalhava como dublê e ficou sabendo que no Brasil existia uma escola dedicada à formação desses profissionais. “Nem sabia que existia escola de dublês no Brasil. Fui para conhecer, comecei a me empolgar com os movimentos e me apaixonei. É muito legal poder viver uma situação diferente a cada dia”. Um de seus últimos trabalhos – e um dos mais marcantes até agora, segundo ele – foi atuar nas cenas de guerra na minissérie “A Casa das Sete Mulheres”, exibida recentemente pela TV Globo. “Você imagina o que é estar numa caravela, vestido com as roupas da época, tentar matar a mocinha da história – a Camila Morgado – e de repente ser surpreendido pelo galã – o Thiago Lacerda? É o máximo! Foi o único jeito que encontrei de continuar a ser criança!”, conta ele, entusiasmado.
Faça da crise uma oportunidade
Às vezes, trabalhar no que gosta implica passar por algumas dificuldades, seja pelas restrições da área ou do mercado. Foi o que aconteceu com a aromista sênior Deize Andrade, química que trabalha na área há 26 anos. Por ser um ramo muito específico, Deize afirma que a mobilidade da área é quase mínima, não há muito para onde ir. “Mas isso não chega a ser um obstáculo para mim, pelo contrário: me estimula e é um motivo a mais para crescer e buscar uma especialização cada vez maior”, diz. Deize trabalha há seis anos na Givaudan, especializada na criação, desenvolvimento e produção de aromas e fragrâncias para alimentos industrializados, produtos de higiene oral e fumo. “É maravilhosa a possibilidade de exercer a criatividade através do olfato, encantar a pessoa que vai comer o alimento e seduzi-la pelo cheiro”. A profissional conta que o leite de soja é um exemplo de alimento que, ao natural, não tem um aroma muito agradável. “Se não tiver um cheiro bom é da natureza do ser humano recusar o alimento, aí que entra o trabalho do aromista”, explica Deize.
O livro “101 maneiras de ter um ótimo dia no trabalho”, de Stephanie Goddard Davidson (Publifolha) traz como regra número 1: “Lembre-se do momento em que você aceitou o emprego. Quais eram os atrativos desse trabalho na época. Escreva uma lista com os motivos que ainda fazem o trabalho valer a pena”. Se a caneta não conseguir escrever nada por mais de alguns segundos, pare e reflita: Será que não estou desperdiçando minha vida em uma atividade que não gosto e não me dá prazer? Para quem enfrentar essa situação e ficar sem saber o que fazer, o guru Mark Albion dá a dica: “Primeiro, reconheça que não está fazendo o que gosta. Algumas pessoas começam uma nova atividade à noite ou nos fins de semana. Elas mantêm o “emprego diurno” e lentamente desenvolvem uma nova profissão. Por fim, não pense que dará certo logo de cara. Lembre-se: se você falhar honesta e integramente (e você o fará), o próximo emprego aparecerá pelo caminho”, finaliza ele.

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